sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

.Ao defunto pobre.

O nosso pobre pobre


Não saberá que fazer com tanto céu.


Poderá ará-lo, semeá-lo, colhê-lo?


Isso ele o fez sempre, duramente


lutou com os torrões,


e agora é suave o céu para lavrar.


O nosso morto-pobre que leva, por fortuna,


sessenta anos de fome cá de baixo,


e para saciar, por fim, como é devido,


sem que a vida mais pontapés lhe dê,


sem que o prendam só porque come,


debaixo da terra, no seu ataúde


já não se mexe, nem se defende,


nem lutará pelo seu salário.


Nunca esperou tanta justiça este homem,


Abarrotaram-no de repente e de repente agradeceu:


Ficou calado de tanta alegria.



NERUDA, P. Plenos Poderes. Lisboa: Dom Quixote. 1977 (p.69)

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