terça-feira, 26 de julho de 2011

.A mesóclise é como uma cólica no meio do discurso: vem sempre.

Toma, toma quinhentos cruzeiros novos e se não ta com inspiração vai por mim, pega essa tua folha luminosa e escreve aí no meio da folha aquela palavra às avessas. Uc? Não seja idiota, essa é a primeira possibilidade, invente novas possibilidades em torno do. Amanhã eu pego o primeiro capítulo, ta? Engulo o pirulito. Ele me olha e diz: você engoliu o pirulito? Eu digo: não faz mal, capitão, o uc é uma saída para tudo.

HILST, H. Fluxo-floema. SP: Globo, 2003. (p.21)

.Vai que-né?.

Eu que agora costumo dormir com livros pelas beiradas. Caídos pelos lados da cama. Perto do cobertor já caído. Eu que agora durmo com os livros e acordo com eles nos pés. Com eles machucando a barriga. Com eles marcando a pele em retângulos disformes. Não foi sempre assim, não foi. Vida que amanheço lendo compulsivamente-coisa-escrita e extraviada até mim, vinda de longe. Não foi sempre assim. NÃO FOI! Levanta e bebe sua água-ruim que desce reclamando espaço. Levanta e atende o dia, que se a noite sobe, a consciência pesa. Consciência? Do de dentro, ou do de fora? Levanta e faz qualquer baboseira que as meninas dos olhos alheios vão consagrar relevante. Levanta só de corpo, incógnita desgastada, repousando de pé. Permanece na vertical um tempo razoável e segue-sendo-seguido-sonhando-subtamente-sabotado.

Lg

segunda-feira, 25 de julho de 2011

As dores dos homens seriam menos agudas se eles não se ocupassem com tanta assiduidade da fantasia.

Quando penso nos limites que circunscrevem as ativas e investigativas faculdades humanas; quando vejo que esgotamos todas as nossas forças em satisfazer nossas necessidades, que apenas tendem a prolongar uma existência miserável; quando constato que a tranqüilidade a respeito de certas questões não passa de uma resignação sonhadora, como se a gente tivesse pintado as paredes entre as quais jazemos presos com feições coloridas e perspectivas risonhas – tudo isso, tudo, me deixa mudo. Meto-me dentro de mim mesmo e acho aí um mundo! E então tudo paira a minha volta, sorrio e sigo a sonhar, penetrando adiante no universo.

GOETHE, Johan Wolfgang. Os sofrimentos do jovem WERTHER.

.Ela censurou-me os exageros, mas de modo tão amável!

Os meus exageros que, de um copo de vinho, me levavam a beber a garrafa toda... Quer pense, quer não pense, estais sempre presente em minha alma. Ela pôs-se a falar de outra coisa, para me obrigar a não ir demasiado fundo no assunto. E eu fui, caríssimo! Ela faz de mim o que quiser.


GOETHE, Johan Wolfgang. Os sofrimentos do jovem WERTHER.

.Coloquial e absurdo, como é a vida.



À memória de Hilda Hilst, por quem sinto incontida, veemente e apaixonada admiração.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

.Sempre antes de dormir eu tivera o hábito de ler qualquer coisa, e lera muito, não trabalhava, mas preparada eu sempre estivera.



Lembrava-me das leituras de antes de dormir que eu, de propósito, procurava que fossem impessoais para me ajudarem a adormecer. A noite é o nosso estado latente. E é tão úmida que nascem plantas. Em casas as luzes se apagam para que se ouçam mais nítidos os grilos, e para que os gafanhotos andem sobre as folhas quase sem as tocarem, as folhas, as folhas, as folhas - na noite a ansiedade suave se transmite através do oco do ar, o vazio é um meio de transporte.


A paixão segundo G.H