segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

.Porque fui mais amante que amiga.

Na hora da minha morte
estarão ao meu lado mais homens
infinitamente mais homens que mulheres
E um deles, dirá um poema sinistro
a jeito de balada em tom menor...
Tem tanto medo da terra
a moça que hoje se enterra
Fez poemas, fez soneto
muito mais meus do que dela.
Lá lá ri, lá lá lá lá

Hilda Hilst

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

.Feliz Natal.



Todas as religiões são a mesma coisa: a religião se resume em culpa e medo, com feriados diferentes e uma dose de desinteligência.


O fato de um crente ser mais feliz que um cético não quer dizer muito mais que o fato de um homem bêbado ser mais feliz que um sóbrio.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

.Filosofia é isso.

Quanto menos se come, bebe, lê livros e vai ao teatro, pensa, ama, teoriza, canta, sofre, pratica esportes, etc., mais economiza e mais cresce o teu capital.
Você é menos, mas tem mais.
Assim todas as paixões e atividades são tragadas pela cobiça.

domingo, 21 de dezembro de 2008

.Fora de sentido.


É humano querer o que nos é preciso, e é humano desejar o que não nos é preciso, mas é para nós desejável. O que é doença é desejar com igual intensidade o que é preciso e o que é desejável, e sofrer por não ser perfeito como se sofresse por não ter pão. O mal romântico é este: é querer a lua como se houvesse maneira de a obter.

.Sem desespero e sem desgosto.

Daquele dia quando me perguntaram o que eu era, ou o que me tornaria. Certamente não sei. Entretanto era de gosto deles que eu não soubesse. Mas caso viesse a réplica, gostaria de perguntar:


- O que você será quando eu for?
Lg

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

.Malditos, gozosos e devotos.



Se eu te entendesse estaria agarrada à lucidez mas estaria louca, livre como tu mas louca.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

.Ataque brilhante.



Santo Agostinho disse de forma bem clara:


“Existe outras formas de atenção, ainda mais cheia de perigo. É a doença da curiosidade. É ela que nos leva a tentar descobrir os segredos da natureza, segredos que estão além de nossa compreensão, que nada nos podem dar e que nenhum homem deveria descobrir”.


Se vocês não entendem como uma coisa funciona, não tem problema: simplesmente desistam e digam que Deus a criou. Vocês não sabem como o impulso nervoso funciona? Tudo bem! Não entendem como as lembranças são depositadas no cérebro? Excelente! A fotossíntese é um processo desconcertantemente complexo? Maravilha!


Por favor não saiam trabalhando em cima do problema, apenas desistam e apelem a deus.

.Tão geladas as pernas e os braços.

Fazia frio, nem tanto frio, mais umidade entrando pelo pano das roupas, pela sola fina esburacada dos sapatos. Fumaríamos e beberíamos sem medidas, haveria música, sempre aquelas vozes roucas, aquele sax gemido e o olho dele posto em cima de mim. Ducha morna distendendo meus músculos. Mas chovia ainda, meus olhos ardiam de frio, o nariz começava a escorrer.

.Arte não é produto de mercado.



A massificação procura baixar a qualidade artística para a altura do gosto médio. Em arte, o gosto médio é mais prejudicial do que o mau gosto... Nunca vi um gênio com gosto médio.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

.As lacunas diminuem.

Um dos efeitos verdadeiramente negativos da religião é que ela nos ensina que é uma virtude satisfazer-se com o
não-entedimento.

.Não ganho dinheiro nem para meu sustento.


Antes de morrer eu queria ser consumida, queria ver as pessoas lerem, porque não tem cabimento escrever a vida inteira para ninguém ler (...). De uma forma ou de outra, eu quero ficar no coração do outro. Escrevo porque tenho a intenção de permanecer, mas sei que sou transitória, efêmera, hóspede das coisas, de tudo.


segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

.Não é necessário sair de casa.

De um certo ponto adiante não há mais retorno.Esse é o ponto que deve ser alcançado.

.Da educação.

A educação não faz as almas. exercita-as. E o exercício moral não vem das belas palavras de virtude, mas do atrito com as circunstâncias. A energia para afrontá-las é a herança de sangue dos capazes de moralidade, felizes na loteria do destino. Os deserdados abatem-se.

.Contemporânea.



As mulheres sempre souberam o que quiseram. Os homens é que realmente não sabem. Eles acham que sabem, mas não sabem.

As mulheres acham que não sabem, mas sabem.

domingo, 14 de dezembro de 2008

.De pensar assim me desvalendo.

Ficamos sem saber o que era João e se João existiu de se pegar

.Mas não tens gula de festa, nem orgulho.



O próprio ano novo tarda. E com ele as amadas.
No festim solitário teus dons se aguçam.
És espiritual e dançarino e fluido,
mas ninguém virá aqui saber como amas
com fervor de diamante e delicadeza de alva,
como, por tua mão a cabana se faz lua.

.Falam por mim.

E falam as flores que tanto amas quando pisadas,
falam os tocos de vela, que comes na extrema penúria,
falam a mesa, os botões,os instrumentos do ofício
e as mil coisas aparentemente fechadas,
cada troço,
cada objeto do sótão,
quanto mais obscuros mais falam.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

.Quase que eu fiz um soneto.


Ria alto,

falava alto,

como se me avisasse;

eu continuava surdo,

a sós comigo

e o meu desprezo.


quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

.DO GROTESCO.


Ai, o mundo. Ai, eu.
Olhe aqui, não fale tanto em si mesmo agora, porque o certo no nosso tempo é abolir o eu, entendes?

.Nunca fui senão uma coisa híbrida, metade céu, metade terra.

Velho louco, diz aquele teu poema.
Digo: Reses, ruídos vãos/ vertigem sobre as pastagens/ ai que dor, que dor tamanha/ de ter plumagens, de ser bifronte/ ai que reveses, que solidões/ ai minha garganta de antanho/ minha garganta de estanho/ garganta de barbatanas e humana/ ai que triste garganta agônica.

Também não precisa chorar, anão, sim, compreendo, eu mesmo estou chorando, era bonito cantar, trovar, mas bem que diziam: tempo não é, senhores, de inocência, nem de ternuras vãs, nem de cantigas, diziam e eu não sabia que a coisa ia ser comigo...

.E rasgam o silêncio.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

.Virginia Woolf.

Agora que o sonho se dissolveu fiquei a tremer no corredor. As coisas parecem empalidecer. Vou à biblioteca procurar um livro qualquer, ler e olhar em volta; ler de novo e depois olhar outra vez. Este poema fala de uma sebe. Vou descer por ela e colher flores de abóbora e de espinheiro cor de luar, rosas bravas e ramos de hera. Vou agarrá-las bem nas minhas mãos e pousá-las no tampo da secretária. Vou sentar-me na margem trémula do rio a olhar os grandes nenúfares brilhantes que espalham sobre o carvalho que domina a sebe a sua luz húmida como um raio lunar. Vou colher flores, entrançá-las numa grinalda e oferecê-las. - Oh, a quem? Surge um obstáculo no fluxo do meu ser; o rio profundo esbarra em qualquer coisa; empurra; puxa; no centro há um nó que não cede. Ah, esta dor, esta angústia. Desfaleço, perco a consciência. Agora, o meu corpo funde-se; estou liberta, incandescente. Agora, o rio espande-se numa imensa maré fértil, rompendo os diques, insinuando-se à força nas fendas, inundando livremente a terra. A quem darei tudo o que flui através de mim, através da argila tépida e porosa do meu corpo? Vou fazer uma grinalda com as minhas flores e oferecê-la - Oh, mas a quem? No paredão vagueiam marinheiros e pares de amantes; os autocarros arfam ao passar no cais a caminho da cidade. Quero dar; quero enriquecer alguém; quero devolver ao mundo toda esta beleza. Enlaçar as minhas flores numa única grinalda e avançar com ela na mão estendida, oferecendo-a - Oh, mas a quem?

.Faça não.



Eu já deveria ter me curado da minha RIDÍCULA obsessão pelo amor.

.Que ele é um pote até aqui de mágoa.

Olha a voz que me resta
Olha a veia que salta
Olha a gota que falta pro desfecho da festa
Por favor

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

.Vulgo de homem calado e metido consigo.

.Futuros amantes se amarão sem saber.



Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvíos
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

.Suporta-se com paciência a cólica dos outros.


Lágrimas não são argumentos.

.Memórias Póstumas de Brás Cubas.





Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

.Eu bebo um pouquinho pra ter argumento.

Hoje não passa de um dia perdido no tempo
E fico longe de tudo o que sei,
Não se fala mais nisso.
Eu sei, eu serei pra você
O que não me importa saber,
Hoje não passo de um vaso
Quebrado no peito
E grito:
Olha o beijo partido.
Onde estará a rainha
Que a lucidez escondeu.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

. Dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos.

Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, "olhos de cigana oblíqua e dissimulada." Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com os meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...

.Férias.


Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

.Depois que eu me encontrar.

Foto: Suelen Folego



Não se pode falar de silêncio como se fala de neve. Não se pode dizer a ninguém como se diria da neve: Sentiu o silêncio desta noite ? Quem ouviu não diz.

.Infindáveis.


Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar.

.Crença no amor dos Homens.

Joga fora todos os medos de preconceitos servis, sob os quais as mentes dos fracos se curvam. Coloca a razão firmemente no trono dela, e apela ao tribunal dela para todos os fatos, todas as opiniões. Questiona com coragem até a existência de deus, porque, se houver um, ele deve aprovar mais o respeito à razão que o medo cego.

.Canta denovo o trovador.


A merencória à luz da lua
Toda canção do seu amor
Quero ver essa dona caminhando
Pelos salões arrastando
O seu vestido rendado...

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

.É um misterio profundo, é o queira ou não queira.

Estranho, sim. As pessoas ficam desconfiadas, ambíguas diante dos apaixonados. Aproximam-se deles, dizem coisas amáveis, mas guardam certa distância, não invadem o casulo imantado que envolve os amantes e que pode explodir como um terreno minado, muita cautela ao pisar nesse terreno. Com sua disciplina indisciplinada, os amantes são seres diferentes e o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça.