quinta-feira, 4 de abril de 2013

.Coragem coração, se joga, que eu te dou a minha mão!



Não conheço seu nome ou paradeiro, adivinho seu rastro e cheiro, vou armado de dentes e coragem, vou morder sua carne selvagem. Varo a noite sem cochilar, aflito. Amanheço imitando o seu grito, me aproximo rondando a sua toca, e ao me ver você me provoca. Você canta a sua agonia louca, água me borbulha na boca, minha presa rugindo sua raça, pernas se debatendo e o seu fervor. Hoje é o dia da graça, hoje é o dia da caça e do caçador. Eu me espicho no espaço feito um gato, pra pegar você, bicho do mato. Saciar a sua avidez mestiça que ao me ver se encolhe e me atiça. E num mesmo impulso me expulsa e abraça, nossas peles grudando de suor. De tocaia fico a espreitar a fera, logo dou-lhe o bote certeiro, já conheço seu dorso de gazela, cavalo brabo montado em pelo. Dominante, não se desembaraça, ofegante, é dona do seu senhor. Hoje é o dia da graça, hoje é o dia da caça e do caçador.
Chico Buarque

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