terça-feira, 12 de agosto de 2008

.Passei a olhar enviesado.

Eu não saberia introduzir aquele artigo senão com aquelas palavras. Fechei os olhos, achei que poderia adivinhar a frase seguinte, e lá estava ela, tal qual. Cobri o texto com as mãos e fui removendo os dedos a cada milímetro, fui abrindo as palavras letra a letra como jogador de pôquer filando as cartas, e eram precisamente as palavras que eu esperava. Então tentei as palavras mais inesperadas, neologismos, arcaísmos, um puta que o pariu sem mais nem menos, metáforas geniais que me ocorriam de improviso, e o que mais eu concebesse já se achava ali impresso sob minhas mãos. Era aflitivo, era como ter um interlocutor que não parasse de tirar palavras da minha boca, era uma agonia. Era ter um plágio que me antecedesse, ter um espião dentro do crânio, um vazamento na imaginação.
Chico Buarque

Um comentário:

Anônimo disse...

e então era Chico Buarque!

nesse momento o segredo foi descoberto e mal posso esperar para ter a obra em minhas mãos.