domingo, 1 de setembro de 2013

.Ensaios sobre os cuidados da vida.



Um breve relato da passagem para o não sei. Hoje quando fui obrigada a me despedir de um amigo para o nunca mais, fiquei me questionando o quanto perdi, ou ganhei, de não ter ficado próximo e me permitido acompanhar os desdobramentos da vida daqueles que passaram pela minha vida. Morar fora pode ter suas vantagens. Veja que o texto não será fácil. Pois bem, em velório de um amigo e companheiro de cervejas, bem nascido, culturalmente diferenciado, viajado o suficiente, com um bom emprego e, como muitos, infeliz com alguma coisa, parei para pensar nas mortes que a ditadura da beleza oferece aos descontentes, pois teria sido esse o principal motivo da sua partida. Como socióloga que sou, de formação, não sei se de competência, parei para comentar com outros amigos, vivos, que o fato principal que levou o amigo, agora morto, era a ditadura estética, que insiste, o tempo todo, que ele estava acima do peso e necessitava reduzir seu estômago. Pois estava lá o amigo morto, verde, costurado por dentro, com toda a sua inteligência e sagacidade sacrificadas. Como a maioria dos meus amigos, esse também era gay, e busquei entender ali o afastamento do parceiro do corpo velado, o choro quase que desesperador do pai e a feição desamparo da mãe. Horrível como todo velório, doloroso como toda partida. Mas o parceiro ali afastado, não por vontade própria, me causou uma comoção gigantesca e me fez, depois de 14 horas, escrever isso aqui. A vida se resume a isso? No caso do amigo, a morrer por um sonho que, às vezes, se modela pelo comportamento dos outros, na busca por um tipo de beleza aceita e julgada normal? No caso do parceiro, a se despedir à distância daquele que acordava ao seu lado, para evitar que a mesma sociedade doente, que levou seu companheiro, o julgue ainda mais? Diria eu que a vida se resume ao incompreensível, e os laços humanos se resumem as aparências, uma pena, como sempre.
LG

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu diria que a vida não se resume. Há tanta complexidade que a redução seria um erro completamente injusto. Pena sua descrença nas relações humanas, socióloga de formação. Há muito mais que aparência. A vida já lhe mostrara. Que o vigor da crença no amor tão íntimo quanto profundo floresça novamente. Quando embebida pelas delicadezas da companhia querida você caminha com maior leveza nessa dança que é o viver.

Lg. disse...

Belo comentário! Que o amor floresça novamente...