Agora que o sonho se dissolveu fiquei a tremer no corredor. As coisas parecem empalidecer. Vou à biblioteca procurar um livro qualquer, ler e olhar em volta; ler de novo e depois olhar outra vez. Este poema fala de uma sebe. Vou descer por ela e colher flores de abóbora e de espinheiro cor de luar, rosas bravas e ramos de hera. Vou agarrá-las bem nas minhas mãos e pousá-las no tampo da secretária. Vou sentar-me na margem trémula do rio a olhar os grandes nenúfares brilhantes que espalham sobre o carvalho que domina a sebe a sua luz húmida como um raio lunar. Vou colher flores, entrançá-las numa grinalda e oferecê-las. - Oh, a quem? Surge um obstáculo no fluxo do meu ser; o rio profundo esbarra em qualquer coisa; empurra; puxa; no centro há um nó que não cede. Ah, esta dor, esta angústia. Desfaleço, perco a consciência. Agora, o meu corpo funde-se; estou liberta, incandescente. Agora, o rio espande-se numa imensa maré fértil, rompendo os diques, insinuando-se à força nas fendas, inundando livremente a terra. A quem darei tudo o que flui através de mim, através da argila tépida e porosa do meu corpo? Vou fazer uma grinalda com as minhas flores e oferecê-la - Oh, mas a quem? No paredão vagueiam marinheiros e pares de amantes; os autocarros arfam ao passar no cais a caminho da cidade. Quero dar; quero enriquecer alguém; quero devolver ao mundo toda esta beleza. Enlaçar as minhas flores numa única grinalda e avançar com ela na mão estendida, oferecendo-a - Oh, mas a quem?
quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
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