terça-feira, 12 de novembro de 2013

.Se falam de mim porque sou diferente, eu falo deles porque são iguais.

Essa manhã, cabisbaixo, Alfred cruzou a porta. Pediu para ser readmitido. Contou-me vantagens, disse que aprendeu certos pratos exóticos pelos lugares que passou. Olhou ao redor, fitou a casa, e exclamou que eu precisava dele. – Veja essa estante, sem ordem!  Aquele armário, esses livros pelo chão. A cama desfeita. Olhe senhora! Passou o dedo pela mobilha e tirou uma camada fina de poeira. Olhei-o com tamanho contentamento, era tão irreal tê-lo na casa nova, mas logo me recompus, Alfred aqui? Nesse fim de mundo? Todo deslocado? Pedi que se justificasse, falasse melhor sobre o abandono, me explicasse por qual dona me trocou. Pedi com certo olhar de quem precisava compreender.  Alfred foi sincero, disse ter me abandonado por eu precisar daqueles momentos só, mas na seqüência me convenceu da minha necessidade em tê-lo por perto. Eu sinto falta, senhora. Sinto falta das conversas malucas no café, sinto falta dos seus malabarismos teóricos e de como pensa que eu entendo o que dizes, sinto falta daquelas loucas mulheres que cruzam essa porta e gargalham, falam alto, bebem e contam crônicas alucinantes. Puxei-o pelo braço, pedi a carteira, assinei. Alfred era meu como se nunca tivesse me deixado. Eu precisava daquele mordomo insensível ali, seja para o que for. Disse: - Passe um café, eu coloco a mesa, preciso te contar tudo. De como sou tentada diariamente, de como minha mente anda cheia e nada confusa, de como tudo isso aqui que você vê agora é meu e se foram os alugueis, os boletos. Preciso te contar das noites, Alfred querido, elas nunca mais tiveram o mesmo significado. Jantares, vinhos, espumantes, queijos, uma loucura amigo. E os corredores? Preciso de uma crônica só para te contar dos corredores daquele trabalho insano, da mulher encostada na porta.  Sente-se mais perto que preciso te contar da próxima viagem, do itinerário todo, da abelha-rainha que conheci, do trabalho, dos meus orientandos, da vida de solteira assumida, do coração nada vazio, do tudo que estou vivendo e não me escapa nada.

LG

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