Enquanto andava sozinho naquela terra
pouco pisada pelos homens, entre o curral, no meio das vacas, falava alto
coisas que saídas da boca soavam sem sentido, mas que na sua cabeça formava uma
reflexão orgânica. Trazia o ouvido limpo e os olhos frescos enquanto corria a mão
nos pelos dos animais, sempre repetindo: por que o mundo me comove tanto?
Sofria as dores de muitas coisas ao mesmo tempo, coisas que nem eram dele, coisas
do de fora. E agradecia, internamente, por estar entre os animais. Era um
alívio. Os homens trazem julgo pesado, quase sempre. Com os animais era apenas
um mugido constante. Teria se embrutecido? Olhava os olhos dos animais, era aquele
profundo, e quando olhava os olhos dos homens pensava conjecturas, sempre para
o ruim. O homem era um abismo, um abismo tão sombrio que devorava. Passou a se
questionar se tinha necessidade disso. Por que não viver fitando os olhos dos
animais, trocando pequenas carícias, alisando seus pelos, em uma atividade
não-destrutiva? E era assim que via o homem, destrutivo? Talvez. Chegava a
pensar que sua própria pele te atrapalhava: se eu arrancasse toda e oferecesse
ao outro, despisse meu ser de fora e oferecesse o ser de dentro, poderia me
aproximar? Poderia me oferecer sem amarras, sem todos os desenhos da pele que intensificavam
os abismos, mas não conseguiria. Era sim um embrutecer, estava desejando o convívio
com os irracionais. Deveria se despir, mas como?
LG