domingo, 29 de novembro de 2015

As coisas principais assaltavam-na em quaisquer momentos, também nos vazios, enchendo-os de significados.


Ela morreu assim que pôde, assim que o médico chamou todos e disse: - pode ser que ela morra. Ela morreu. Foi rápido. Parecia uma procuração. Na verdade parecia que precisava desse parecer libertador dizendo, ela vai morrer. De fato, depois disso, eu cresci esperando o dia dessa abolição do mundo. Que me chamassem, eu e todos os mais queridos em uma salinha escura, e pedissem que eu esperasse no corredor. Depois, ao ver todos saindo com cara de choro, me abraçassem e começassem a realizar os meus mais sortidos desejos. Diriam ao pé do ouvido dos interessados: - Fazemos isso porque ela está para morrer. E por mais que eu soubesse o que fofocavam, ainda me esforçava para fazer uma cara de grande resignação. Triste que não entendiam que todos estavam com a mesma carta para vencer, que a morte chegaria cedo ou tarde, como se deve. Mas aquele, cuja o aviso é dado com antecedência reservamos um fio de cuidado, um tempo a mais, uma carícia simbólica. A melancolia na morte é um puro desprezo sentido da vida. A morte é o defrontar com o espelho e dizer: - Há tanta coisa em mim silenciosa, que permanecerá assim no pálido do nada. E quem ouvia chorava com se sentisse culpa pelo quase morto que tanto recebeu ofensas em vida. A morte enche de complacência até aqueles que desconhecem o que isso significa. A morte sofrida e sentida se alaga no remorso, o que é melhor não tê-lo.


“Ainda não se cansara de existir e bastava-se tanto que às vezes, de grande felicidade, sentia a tristeza cobri-la como a sombra de um manto, deixando-a fresca e silenciosa como um entardecer. Ela nada esperava. Ela era em si, o próprio fim.” C, Liscpeckor – Perto do Coração Selvagem

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