sexta-feira, 22 de junho de 2012

.Acorda.


É tanto trabalho para amanhã, notas para somar, provas para aplicar, capítulos para corrigir, dentista, esteticista e outros istas, que resolvi mandar tudo as favas e terminar descompromissadamente o dia. Palavra longa, não? E esse frio, covarde, não? Covarde foi o Alfred essa manhã. Acredite vocês ou não, vou lhes contar. Amontoou (palavra feia) a louça, empilhou os copos, deixou tudo quase limpo, tirou a sujeira “mais grossa”, ficou tudo com ar aceitável e escafedeu-se. Isso mesmo leitor, zarpou, puxou o pé, saiu vazado, ah, sei lá o que mais. Se não me sobrasse educação teria o mandado aos quintos do inferno. Esperei que voltasse, voltou com uma cara lavada (diferente da louça), com uma desculpinha aqui, olhadinha baixa acolá, que fiquei com pena. Pois foi tratando de ligar a Bethânia e sair cantando cozinha adentro. (pode ser tudojunto?). Hilst teria mandado para o inferno, com adentrotudojunto. Se bem que, depois de visitar a casa do sol, e tomar café da manhã com seu ex mordomo, na sua ex cozinha, deu para perceber que ela era, sobretudo, querida. Talvez também seu mordomo não empilhasse a louça. Que mau humor. Só não está pior porque chegou minha edição premiada do Guimarães e o novo DVD da Betha. Ela e seus novos shows esse ano, agenda maravilhosa, vou em três. Depois de ter sobrevivido ao Chico, ano passado, posso arriscar Betha esse ano. Desnecessário isso, três. O coração vai parar no primeiro mesmo, só vai ter gerado gastos, hotéis reservados, diárias perdidas, cadeiras vazias. E perguntarão: cadê a moça, fãnzooona da deusa? Uns: morreu de felicidade na última apresentação. Outros: não aguentou pagar, desistiu. Mais um: está de caso com a Betha e vai assistir do palco. E ela estará lá, confirmando o primeiro palpite e esticada na caixa infinita. Infinita é bobagem gente. Todos sabem que quando morre o próximo, vão lá no túmulo da família, quebram a caixa velha, empilha todos os ossinhos e colocam em um saco, com o menor cuidado do mundo. Ai jogam o saco lá no canto para ter espaço para a caixa nova. Verdade, eu vi. Vi do Tio, do vô e da avó Helena, só me comovi nesse último caso, uma parte de você resumida em um saco jogado lá no canto. Credo. Frio e textos mortuários não dá. Deixemos isso para as estórias de Allan Poe, a imaginação de Tim Burton e a voz de Vincent Price. Ficamos por aqui, com a corrida para a jornada tripla assim que despertar o relógio, trabalho, mestrado, biblioteca, mestrado, trabalho, casa, dissertação. Sentirei falta de Londrina e desse frio quando tudo isso acabar, ou quando a mudança vier para outra cidade, ou quando vier para a caixa, depois para o saco, depois para o fundo, depois para o canto, depois para o nada. Que texto bonito e motivador que produzi, é sempre um orgulho. Alfred, venha até aqui que estou com medo do saco. Boa noite.
LG

quinta-feira, 21 de junho de 2012

.Esperem.


Há certas coisas que eu preferiria calar. Há outras que eu preferiria dizer. Agora não sei se digo as coisas que preferiria calar ou se calo as coisas que preferiria dizer. Preferiria calar, mas vou dizer que é preciso descobrir o tempo. Se descobrirem o tempo vão ver que as coisas de fora e as coisas de dentro ficam transitáveis. 

HH. Fluxo-Floema. p.38.

terça-feira, 19 de junho de 2012

.Dos buracos do de dentro, de como tenho esperado que a outra chegue. Não essa. Que se dispa. Não que se comunique.


É tudo recurso. Era uma questão de tempo. Você pediu o texto, e eu escrevi. Só foi a menina entrar no apartamento, sentar ao lado da cama, e começar a confessar suas estórias insignificantes, para que o texto saísse. Fingi que ouvia, a queria longe, mas sabia que era uma questão de tempo, que logo sentaria ao lado e sentiria a outra metade do colchão amassar. Não demonstrar interesse não é uma questão de tempo, é uma questão de estratégia. Que ridículo isso. Apague tudo e comece novamente. Ridículo foi aquela outra contar, a outra do Brennand, que foi ver a largada e se emocionou. Contou que se emocionou? Não. Mas deve ter se emocionado. E o que era mesmo que a menina na cama falava? Falava de assimetrias sei lá do que. Falou que cheirou tanta droga que agora os dentes estavam gastos. Falou que ficou tão magra que o frio se tornou insuportável. Falou que gostaria de ser outra, mas continuava sendo. A respeito do. De acordo com. Era tudo mistura. Era recurso. Ia falar outra coisa, mas essa louca me entra quarto adentro. Mandou tirar a música, disse para não fingir inteligência, jogou os livros pela janela, quebrou os quadros, sentou no sofá e ligou a TV. Queria ser inútil como a vida toda e ela mesma. E agora fico eu obrigada a sentar no colchão, enquanto aquela me toma o sofá e me bebe todo o café. Petulante. Se ao menos me bebesse. Porcaria de livros e cacos, porcaria de buracos que deixamos abrir. Não era para ser um texto bonito, não era para ser esse. Era para escrever dos buracos, e como eles se deixam abrir.
LG

domingo, 17 de junho de 2012

Oh, poupem-me. Não, não me poupem.


Vi que você e eu subíamos a colina. que colina? Uma colina que vi na minha visão. Ruisis, por favor, não diga que a subida era íngreme. Posso não dizer que era íngreme, mas a subida era difícil de subir. Adiante, adiante, Ruisis, eu estou ficando impaciente. Os arreios eram de couro aveludado. Os arreios de quem? Dos cavalos. As selas eram de prata delicada. As selas de quem? Do cavalo. Oh, Ruisis, por que você não diz de uma vez que estamos a cavalo e pronto?

sábado, 16 de junho de 2012

.Do NADA.


Bonito isso. Essa coisa de subir a colina a cavalo, escuta, era de noite ou de dia? Eram planos. Chegamos ao cume. Não saímos de casa. Era manhã. O ar tinha certos cheiros. Concentre-se, isso me interessa, que cheiros exatamente? Oh, mulher, conte os cheiros que havia. Se eu soubesse que cheiros eram eu não teria dito certos. As sutilezas da língua. Então aproveite e fale do seu de dentro, porque assim como você vem fazendo a coisa vai se perder. O meu de dentro é turvo, o meu de dentro quer se contar inteiro, quer dizer que nos juntamos aqui por algum propósito, acho que seremos alguém, não podemos estar aqui por nada. Nem eu as colocaria aqui por nada, entende? Tu mesmo, seria tão simples te definir. Ou não te defino? 
Hilst, H. Fluxo-Floema. SP: Globo, 2003. (p.37)

terça-feira, 12 de junho de 2012

.Ela presente.

Receita curta e boa: ser fiel e ser companheira.

.Bem pertinho de mim.



Quero ver a água do mar
Lambendo você nos seus pés
Você vai me despertar
Um apetite de mil caetés
Deixa essa chama queimar